segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Eu escondi os olhos, simulei um tossir, um engasgo.
Mas, as faces rosadas de um homem são difíceis de enganar.
Os olhos dele penetrados nos meus,
movendo com manejos simples e ritmados minha atenção.
Torci para que desviasse, simulasse um cuspir,
um escarrar, qualquer feição que não a de naja hipnótica.
Em alguns passos sua mão chegaria tão perto do meu pau,
o hálito, se falasse, impregnaria minha barba,
tingiria meus cabelos com anis ou qualquer coisa doce.
Não pude encarar, virei o rosto,
as sacolas que carregava encostaram na minha perna,
ouvi um craquelar plástico, ouvi um expirar profundo e cansado,
penso que talvez pude sentir sua temperatura,
definitivamente senti um certo calor vindo do braço esquerdo.
Passou.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

11:11

Ontem quase morri de ciúmes.
Quase te matei.
Daí, matei uma árvore que crescia em mim,
que me preenchia.
Os galhos arrancados e as folhas decepadas me fazem falta.
Escorreu uma seiva branca, um pouco venenosa.
Acho que a raiz me segurava ao chão.

Agora, tudo é soltura, solidão.

eu chovia

- Não era assim tão óbvio, era?
- Claro, como luz de relâmpago.

e o céu desabou.
lavou os bueiros,
sujou o mar.

amanhã acorda outro dia, acho.
ou nem vem me acordar.

texto último.

Saiu para comprar cigarros,
saiu para ver o mar,
descobrir as Américas.
Se lançou no hercúleo projeto de viver.
Cometera o passo fundamental, o marco zero, o início.

Em dias muito claros me bate à porta, me chama pelo nome.
Grita tão alto esse outro, que me acorda por dentro.
Se olhasse pela grande angular dos corredores,
veria um gurizinho,
um fedelho de olhos semi-cerrados e sorriso torto que,
sem abrir a boquinha miúda, diria:
vim te ver, me encontrar.