terça-feira, 29 de agosto de 2006

Sonoras

Há qualquer coisa de descrença e pavor em suas palavras. Ele fala sem abrir a boca. Mesmo quando é preciso palavras vigorosas ele encontra um meio de dizê-las sem que se ouça som. Há qualquer coisa muda naquele menino. Se faz ouvir pelos cantos negros de dentro. Dentro de si. Se faz ouvir em gritos energéticos, perturbadores. Se ouve. Dentro do buraco escuro que há em cada um imprime com violência suas palavras. A mesma violência que usa para se ouvir pela madrugada. Há qualquer coisa repetindo dentro daquele buraco negro. Em tons cada vez mais inaudíveis e ensurdecedores. Diz a si mesmo que não volta mais, que dessa vez acabou. Mas dentro dele as palavras se perdem soltas. Não há ninguém ali. Não há nada. Só um oco-vazio-espacial, onde o som não propaga. Aquele menino não volta mais. Ouviu um grito dentro de si e se perdeu procurando o chamado. Aquele menino quieto não ouve mais. As palavras são jogadas direto no vazio-oco de si. Não as decodifica, que decodificar é para os que prestam atenção. Os cães prestam atenção. Desgarrou-se de comunicar. Que comunicar é para quem deseja se fazer entender. No vazio hermético de ser ele comunica com o negro-oco, com o rombo que há em cada um de nós.

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