terça-feira, 3 de outubro de 2006

“eu”, minúsculo.


para aqueles que perdem suas chaves;



Houve uma noite tão escura quanto àquela?
Mas e se eu tivesse uma chave naquela noite?
Uma chave que abrisse tudo.
As chaves não abrem, elas giram,
em torno de si e dos tambores das portas.
Então chaves não abrem, elas dançam, rodam.
Elas só brilham quando enfiadas na luz do sol.
Metaisinhos de níquel brilhante. Chave.
Espera, afinal, eu tenho ou não uma chave.
Tenho? Cadê? Sempre a levo comigo. Sempre a chave.
Sempre há chave para tudo.
O cara de chapéu preto, com chaves na mão,
“eu”, minúsculo. Apressado contra o vento.
Armando o guarda-chuva, (Guardar o que?).
As chaves não abrem e fecham. Essas não.
Enquanto eu ando apressado,
me movimentando sofrido pela vastidão da força do vento,
uma nuvem negra de fumaça enraivecida com veneno me vem atrás.
Vem me perseguindo pelo caminho de casa.
Mas ainda tenho a chave.
A chave que brilha e não abre ou fecha.
Chave que dá a luz.
Chave de abrir-e-não-fechar as coisas.
Rios se formaram, sujando a barra da minha calça.
Esse guarda-chuva não está guardando nada.
Não tem nada nele, por dentro, digo.
Cadê a água que ele deveria guardar?
Molhou minhas calças e esse meu chapéu.
Acho que esse não-guarda-nada-chuva deixou
cair o que deveria ter guardado. Por isso têm tantas poças d´água pelo chão.
Eu não vou secar.
Foi culpa da nuvem enraivecida de veneno negro
ou foi desse não-guarda-porra-nenhuma-chuva.
Acho que é isso.
Os guarda-chuvas abrem e fecham, não as chaves.
Então as chaves poderiam guardar a água, em bolsas imaginárias,
capazes de armazenar todo o líquido fedorento, negro, desse algodão chorão.
E os guarda-chuvas que realmente abrem?
Eles abrem portas? Se abrem, como faço?
Enfio a ponta do guarda-chuva na porta e entro?

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